Vamos iniciar com notícias relacionadas com a área da gerontologia (lares e centros para demência), mas antes importa realçar uma nota acerca da fotografia que acompanha este post.
Trata-se de um quadro relativo à crise das tulipas. A crise das tulipas foi o primeiro dos exemplos para o que é qualquer bolha especulativa em grande escala. As tulipas foram introduzidas na Holanda no século XVI, tendo aumentado a sua procura e, consequentemente, os respetivos preços. Com o passar dos anos, estes aumentavam cada vez mais rápido, tornando o comércio de bulbos de tulipas bastante lucrativo. Pessoas de todas as classes vendiam propriedades para investir em tulipas e, em meados de 1630 surgiram contratos futuros para negociar os bulbos antes da própria colheita. Em 1637, devido a diversos fatores, houve uma perda de confiança em tais títulos, levando muitos a uma corrida para o resgate dos seus investimentos. Consequentemente, os preços caíram de forma súbita, tendo inúmeros negociantes ido à falência.
Basicamente uma bolha (uma moda).
A PRIMEIRA BOLHA OS “LARES PREMIUM”
Nos anos 90 e 2000 abriram uma série de lares premium. Naquele tempo pensava-se que a nossa população de idosos de classe média-alta estaria disponível para este tipo de lares ou residências.
Estes lares de idosos tinham em comum o investimento brutal em acabamentos (pedra nas casas de banho, madeira nas paredes e plasmas nos quartos). Também tinham em comum a construção em zonas remotas, sem transporte público, nem serviços à volta. Basicamente era um lar ou residência “de luxo” num “buraco”.
Tudo isto com cobertura bancária, que correspondia normalmente a 50% do investimento.
O resultado foi catastrófico, e foram poucos os que ainda não choram por este investimento.
AGORA TEMOS OS LARES E CENTROS PARA DEMÊNCIA
Depois do sector ter metido o “pé na poça” com os “lares premium” e, depois, de induzido pelos políticos a um crescimento desmesurado via PARES e POPH (Potencial Humano) voltamos outra vez a ter uma bolha e esta é relativa aos Lares e Centros para Demência (tipo Centros de Dia).
Do meu ponto de vista, o sector está-se a meter noutro problema induzido por espectativas fora de qualquer critério racional.
Vou apresentar as minhas razões pelas quais uma instituição não deve fazer um Lar ou um Centro para Demência. Se depois de lerem este post quiserem avançar, pelo menos espero que sejam conscientes dos problemas com que se depara a criação de um serviço específico para a Demência.
Motivo 1. Custos potencialmente subestimados
Os custos num centro deste tipo são muito mais elevados do que num Lar para Idosos ou Centro de Dia generalista. Normalmente, implica contratação de, pelo menos:
– Mais de um terço de pessoal auxiliar (apesar de tudo, esta estimativa não é exagerada);
– Uma equipa de terapeutas (estagiários pedagógicos servem para complementar, não para substituir). No caso de desejar, por exemplo, estabelecer um objetivo de 20h de atividade terapêutica por semana, a nossa equipa deveria ser,no mínimo dos mínimos, composta por 3 a 6 terapeutas (fisioterapeuta, gerontólogo, terapeuta ocupacional e psicólogo).
– Equipa médica especializada (necessita de psiquiatra ou neurologista). Não deveria servir um médico de medicina geral. (Prepare-se para pagar por volta de 35€ por hora, num mínimo de, pelo menos, 4 horas. E tome em atenção que nestas quatro horas são atendidos 8 utentes).
– Advogado (seria o primeiro que eu contrataria), porque vai precisar de apoiar a tomada de decisão (ou não) de interdição por parte da família.
Motivo 2. Acumulação de know-how (conhecimento acerca de gestão na área da Demência)
Um terapeuta faz terapia, o médico faz medicina e assim sucessivamente. Contudo, num Lar ou num Centro para Demência necessita de pessoas altamente qualificadas na gestão de Demência e Portugal não tem estes profissionais. Basicamente não existem porque não existe em Portugal know-how em gestão da demência, sendo que a única coisa que temos são algumas formações “primitivas” ou, por sua vez, algum conhecimento transferido dos serviços sociais generalistas.
Motivo 3. Expectativas das famílias
Em caso de demência, o cliente não é o utente, mas sim a sua família, e garanto que estes procuram um serviço específico.
As famílias podem não se limitar nos custos, podendo pagar tudo aquilo que se lhes peça, mas estas são famílias dotadas de um alto nível intelectual e capazes de consultar a internet ou viajar de avião para visitar outros centros no estrangeiro.
Não se surpreendam se um membro da família aparecer com um artigo científico de revisão da literatura acerca de intervenção não-farmacológica, de forma a inquirir os serviços sobre o tipo de terapia, intensidade, tipo de avaliação da intervenção, etc. que está a ser realizado. No entanto, deve ter claro que deverá responder de forma clara e sincera.
Por certo, são famílias que se encontram totalmente envolvidas ao cuidado do seu familiar, e podem preparar o advogado no caso de “vislumbre de negligência” porque vão deparar com uma reclamação no Ministério Público em 3, 2, 1.
PENSE NAS DIFICULDADES E NÃO UNICAMENTE NA PROCURA
Pode pensar que estou a exagerar e pode ter razão, porque a minha intenção é demovê-lo de ter um serviço deste tipo. A minha intenção é clara e explícita.
Anteriormente, posicionei-me, a favor duma maior razoabilidade em termos dos “lares premium” , do tipo de financiamento de concretas Unidades de Cuidados Continuados (nomeadamente, serviços paliativos) ou da indução a uma excessiva oferta promovida pelo PARES e o POPH (Potencial Humano).
Agora, faço-o relativamente aos Lares e Centros para Demência. Considero que são uma bolha, não porque não sejam necessários ou não tenham procura, mas porque existe uma enorme discrepância entre as suas expectativas e o que Portugal pode ser capar de oferecer nesta área.
Desde já os meus melhores cumprimentos, e convido-lhe a comentar este Post